segunda-feira, 18 de novembro de 2013

"Os Fogueteiros do bem"

Quem nunca sonhou, pelo menos enquanto criança, em enviar foguetes ao espaço? Em estudar o que existe além do nosso planeta? Muitos estudantes pensam nessas atividades sem nem imaginar que existe uma profissão que pode realizar tudo isso: o engenheiro aeroespacial. Agora, falando como gente grande para quem já tem de decidir o futuro profissional, a profissão é mais possível do que parece e faz parte de uma área em grande ascensão no Brasil.

Segundo o diretor de satélites, aplicações e desenvolvimento da Agência Espacial Brasileira, (AEB), Carlos Alberto Gurgel Veras, a área envolve muito mais do que a criação de foguetes e os lançamentos ao espaço. Existem duas linhas de formação: a engenharia espacial e a aeronáutica. A primeira estuda tudo o que envolve satélites e foguetes; a segunda é mais voltada ao estudo de aeronaves.

Durante o curso, uma área importante é a de materiais avançados, essencial paras as duas linhas de formação. Os materiais usados para construir tanto aviões quanto foguetes devem ser leves e resistentes, pois o custo de lançamento de um satélite é influenciado pelo seu peso: quanto mais pesado, mais ele precisa de combustível para ser colocado em órbita; quanto maior o satélite, maior será o foguete necessário para lançá-lo, custando mais. Também são estudados os sistemas propulsivos, os motores dos foguetes e as turbinas da aviação. Aprender como todos esses sistemas são controlados também é essencial, pois esse conjunto é unido em um computador, que serve como um cérebro e é controlado por um profissional. Quem quiser estudar a área precisa gostar muito de matemática, química e física. Para Veras, entender de todos esses assuntos é o que forma o perfil adequado do profissional aeroespacial.

Para os já formados em profissões da área de exatas que ainda pretendem entrar para o mundo espacial, existem cursos de pós-graduação em instituições como o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), o Instituto de Aeronáutica e Espaço (IAE), o Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA) e a Universidade Federal do ABC (UFABC).
Veras indica que há uma falta de profissionais no mercado, que cresce rapidamente. Com o apoio do Programa Ciências sem Fronteiras e das principais agências espaciais do mundo, em 2013 e 2014 a AEB coordenará a oferta de 300 bolsas de estudo nas diversas modalidades da área, incluindo cursos e treinamentos em universidades, instituições de pesquisa e empresas do exterior, de países líderes na área espacial.
Os futuros engenheiros aeroespaciais da UFABC participam de competições de aerodesign, onde são criados protótipos de aeromodelos


Universidades brasileiras
Com foco na área espacial, atualmente existem poucos cursos de graduação no Brasil, oferecidos pela Universidade do Vale do Paraíba (Univap), pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), pela Universidade Federal do ABC (UFABC), pela Universidade Federal de Santa Catarina Campus Joinville (UFSC - Joinville), pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e pela Universidade de Brasília (UNB). Nos cursos são abordados assuntos relacionados a satélites, veículos lançadores (os foguetes) e até antenas de comunicação, que fazem parte do segmento terrestre.

Anteriormente a esses cursos de graduação, a maioria dos profissionais saía de uma formação em outras engenharias, da química, física ou matemática e se especializava na área. O diferencial do aluno que entra na universidade já na graduação aeroespacial é que ele aprende as disciplinas básicas das engenharias e depois já se especializa no setor, onde conhece todos os princípios e técnicas da construção de um avião ou foguete no início de sua carreira.

Na Univap, o coordenador do curso de engenharia aeronáutica e espaço, Moacir de Sousa Prado, explica que o curso com as duas linhas de formação existe desde 2005 e dura cinco anos. Atualmente, a universidade conta com 70 alunos e oferece 40 vagas noturnas a cada semestre. Nos primeiros dois anos o aluno estuda disciplinas comuns a todas as engenharias. Após esse período, passa a estudar as específicas, como aerodinâmica, controle de aeronaves, segurança de voo, propulsão. Além disso, os estudantes podem escolher como disciplinas eletivas as da área ambiental, considerando que aeronaves e foguetes são grandes poluidores. A universidade mantém laboratórios como um túnel de vento, onde é construído um modelo físico e pequeno de aeronave e nele é verificado o escoamento de ar ao redor das asas, além de laboratórios de propulsão, controle de aeronaves e eletrônica digital.

A UFABC oferece o curso desde 2007. São disponibilizadas 120 vagas anuais, 60 no turno diurno e o restante no noturno, com duração de 5 anos. Segundo o vice-coordenador, André Luís da Silva, é buscado um equilíbrio entre as aplicações aeronáuticas e espaciais e, após formado, o aluno pode também trabalhar na área automobilística e naval, além do setor de alta tecnologia e integração de sistemas. Entre os laboratórios disponíveis são os de controle automático, navegação, guiagem e controle e estruturas, além de softwares de simulação aplicados em áreas como de aerodinâmica e propulsão. “Quem inicia o curso aeroespacial obtém uma visão integrada e multidisciplinar de um projeto espacial. Profissionais de outras áreas se especializam em um tópico. É como se os engenheiros de outras áreas fossem os músicos de uma orquestra e o aeroespacial fosse o maestro”, explica.

Mercado de trabalho
Veras, da AEB, acredita que a tendência é o Brasil investir cada vez mais na área espacial. “Após começar a melhorar os problemas sociais do País, vão sobrar mais recursos, como os do pré-sal, que teremos daqui a alguns anos, para a área. Existem demandas que interessam ao País, como a proteção de nossas fronteiras e o controle de vazamentos de óleo, que são mais facilmente executados por satélites”, explica. Para 2015, já existe previsão de lançamento de um satélite geoestacionário de defesa e comunicação, que controlará parte a banda larga brasileira e parte a comunicação das forças armadas. O primeiro satélite será comprado da França. “Para o lançamento de um satélite desse porte, envolvendo depois a operação do mesmo, 24 horas por dia, são necessários mais de 100 profissionais. Além disso, dezenas de técnicos irão acompanhar a construção do satélite na empresa franco-italiana Thales Alenia Space”, diz.


O Brasil ainda não possuí o seu próprio veículo lançador de satélites, porém existem vários projetos para quem estiver realmente interessado em trabalhar com o espaço. O Alcântara Cyclone Space (CLS), consórcio feito entre Brasil e Ucrânia para lançar foguetes ucranianos no Centro de Lançamento de Alcântara (CLA), demandará profissionais brasileiros para operar a base de lançamento e fazer a manutenção e projeto dos foguetes. O primeiro lançamento está previsto para 2014. Na tarefa de lançar um foguete, geralmente são feitos testes por quase dois anos, envolvendo de maneira direta cerca de 100 engenheiros aeroespaciais e 500 técnicos.​

O Veículo Lançador de Satélites (VLS), programa brasileiro que existe desde a década de 60, no qual ocorreu o maior acidente espacial da história, está sendo reestruturado. Nele, da Silva indica que há uma carência muito grande de profissionais da área de propulsão e controle de foguetes. Existe também o Veículo Lançador de Microssatélite (VLM), que lança foguetes de menor porte e tem uma aplicação comercial. “Por meio dele, o Brasil vai tentar dominar o setor da propulsão líquida, utilizada pelos Estados Unidos e pela Rússia”, diz. O programa é de longo prazo: suas previsões são para 2020. Uma grande oportunidade para quem está iniciando os estudos agora.

O coordenador do curso da UFSC Campus de Joinville, Juan Pablo Salazar, diz que a multidisciplinaridade é essencial para o engenheiro aeroespacial. “É um curso desafiador e estimulante, o aluno tem de gostar da área, além de gostar de matemática e física. É preciso disposição”, afirma. O profissional também pode contribuir para outras áreas, gerando produtos econômicos tangíveis, como em medicina, nas cirurgias feitas à distância, que necessitam da tecnologia de comunicação. Ou então no monitoramento de solo, em lugares remotos. Mas os foguetes e satélites no espaço não ficam para trás. “O ser humano está sempre procurando expandir suas fronteiras e hoje, esse horizonte é o espaço”, conclui.

Fonte: Terra

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