"Sentia isso como uma pressão"
À
diferença do Nobel, cujos vencedores só sabem da premiação após o
anúncio oficial na Suécia, os ganhadores da Medalha Fields são
informados previamente. O carioca, que já havia sido cogitado para o
prêmio em 2010, recebeu a notícia há dois meses, com um certo alívio.
—
Há vários anos existia uma expectativa nessa direção, e realmente eu
sentia isso como uma pressão sobre mim, também pela sua importância para
o Brasil, que de maneira um pouco estranha nunca teve prêmios
internacionais desse porte, como um Nobel. Assim, ficava um pouco
pesado. A notícia da medalha teve, para mim, um primeiro efeito de
alívio — conta Avila.
O matemático trabalha com a área de
sistemas dinâmicos, mais conhecida como a teoria do caos, que busca
descrever e prever como evoluem todos os sistemas que mudam com o tempo.
A formação de uma nuvem, por exemplo, desenvolve-se como base em um
sem-número de fatores. Trata-se de um campo de mais alta complexidade.
No Impa, a notícia sobre o prêmio foi recebida com muita festa:
—
Essa medalha para o Artur vem primeiro coroar o trabalho individual
dele, mas, ao mesmo tempo, é coerente com a situação da matemática
brasileira — pondera César Camacho, diretor-geral do Impa. — Não é como
um salto quântico. Um feito excepcional, sim, mas não fora da curva. É
resultado de um longo trabalho de construção do Impa como centro de
excelência da matemática mundial nos últimos 62 anos. Somos uma
instituição aberta, com muitos contatos e interação com outras no
exterior, e na qual tudo é feito com base no mérito.
Avila
e os outros três ganhadores deste ano se juntam às outras 52 pessoas
laureadas desde a primeira Medalha Fields, em 1936. O prêmio foi criado
pelo canadense John Charles Fields, para “reparar” o erro do sueco
Alfred Nobels, que, ao elaborar o Prêmio Nobel, em 1895, desconsiderou a
matemática como ciência importante. Hoje, os ganhadores da Medalha
Fields recebem 15 mil dólares canadenses (R$ 31 mil). Valor bem menor do
que as 8 milhões de coroas suecas (cerca de R$ 2,7 milhões) pagos aos
premiados com o Nobel. Nas 17 edições anteriores da Fields, os
americanos foram os mais premiados (12 vezes). A medalha de Ávila é a
primeira de um matemático da América Latina.
Orientador
do pesquisador em seu doutorado no Impa, Welington de Melo afirma que o
trabalho dele já o credenciava à medalha no congresso de 2010, na cidade
indiana de Hyderabad (a próxima edição, aliás, acontece no Rio, em
2018.).
— Ele só não ganhou porque tinha outra chance. Os
trabalhos que tinha feito já eram mais do que suficientes — avalia. — O
Brasil nunca teve um ganhador do Nobel antes, e a Fields é algo até
mais difícil. Espero que o Artur sirva como estímulo para outros jovens
se esforçarem para serem grandes matemáticos e continuarem a levar a
matemática brasileira e mundial a um altíssimo nível.
Ex-professor
e hoje colaborador de Avila, Marcelo Viana, pesquisador do Impa e
presidente da Sociedade Brasileira de Matemática, diz que um dos
talentos dele é a capacidade de transitar por muitas áreas da matemática
avançada.
— Artur pegou a bagagem que acumulou no Impa e
foi além. Ele é muito produtivo, tem grande capacidade de concentração e
não faz nada que não seja profundo — elogia.
Presidente da IMU e primeira mulher nesse posto, a belga Ingrid Daubechies vê em Avila versatilidade e espírito colaborativo.
—
Ele trabalha com sistemas dinâmicos, um campo muito interessante que se
conecta com uma ampla gama de aplicações, mas também com diversas
dificuldades técnicas e questões em aberto das quais muitas ele
simplesmente derrubou ou desbloqueou. — explica. — Artur surpreendeu
pela abrangência de suas colaborações. Antes, era frequente que os mais
fortes resultados fossem obtidos por matemáticos isoladamente ou em
colaboração com apenas uma pessoa, mas isso está mudando. Muitos dos
melhores e mais jovens matemáticos gostam de colaborar entre si. Esta é
uma característica de Artur.
Assim como Camacho, Ingrid
vê na escolha de Avila para o prêmio um reconhecimento da comunidade
matemática internacional ao trabalho realizado pelo Impa.
-
O Impa tem sido um forte centro de produção de pesquisas em matemática
já há muitos anos e isso é um reconhecimento de que o Brasil agora
chegou ao mais alto nível possível – diz. - A matemática é a mais antiga
das ciências e é maravilhoso ver o seu desenvolvimento em locais fora
dos centros tradicionais, como na Europa e América do Norte.
(
OGlobo)
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